Artigos da RBSO abordam exposição ao cloro, distúrbios musculoesqueléticos, sobrecarga em intérpretes de Libras e subnotificação da perda auditiva ocupacional.
A Revista Brasileira de Saúde Ocupacional (RBSO) da Fundacentro reúne textos que aprofundam temas de grande relevância para a saúde do trabalhador. Entre os destaques, estão os artigos de revisão sobre os efeitos da exposição ao gás cloro e a evolução da síndrome da disfunção reativa das vias aéreas, e outro de revisão sistemática de intervenções para prevenir distúrbios musculoesqueléticos no ambiente de trabalho. Já o artigo de pesquisa traz um estudo sobre a percepção de sintomas osteomusculares entre intérpretes de língua de sinais. Também há um relato de experiência sobre uma oficina educativa voltada ao enfrentamento da subnotificação da perda auditiva induzida por ruído.
Exposição ao gás cloro e SDRVA
O gás cloro, de cor amarelo-esverdeada e forte odor, é amplamente usado na indústria e no tratamento de água. Sua inalação pode causar danos agudos ao sistema respiratório, principalmente em ambientes mal ventilados e sem proteção adequada. A exposição ocorre tanto em locais de trabalho quanto em residências, quando há uso incorreto de produtos de limpeza.
A revisão sistemática Exposição ao gás cloro e padrões evolutivos da síndrome da disfunção reativa das vias aéreas: uma revisão sistemáticaanalisou 22 estudos internacionais, com destaque para os 170 casos diagnosticados com a Síndrome da Disfunção Reativa das Vias Aéreas (SDRVA), sendo 65% de origem ocupacional. Os sintomas persistentes, alterações respiratórias e a falta de padronização nos registros dificultam o acompanhamento e a prevenção.
Os autores do artigo de revisão reforçam a importância de políticas mais rigorosas de proteção respiratória e de controle ambiental, especialmente em setores onde o cloro é amplamente utilizado. A conscientização da população e de empregadores pode evitar casos graves e óbitos relacionados à exposição.
Distúrbios musculoesqueléticos
Os distúrbios musculoesqueléticos (DME) são uma das principais causas de afastamento no ambiente laboral. A sobrecarga física, especialmente em atividades manuais ou automatizadas, tem causado dores, sofrimento e perda de produtividade. De acordo com as autoras do artigo Intervenções no trabalho para prevenção de distúrbios musculoesqueléticos: revisão sistemática de ensaios randomizados, as estratégias de prevenção no próprio local de trabalho são cada vez mais necessárias.
A revisão analisou ensaios randomizados, clínicos ou comunitários publicados entre 2015 e 2020. Intervenções com exercícios físicos demonstraram redução na dor, uso de medicamentos e afastamentos. A Ergonomia Participativa, que envolve diretamente os trabalhadores nas mudanças, mostrou-se eficaz, embora intervenções organizacionais ainda estejam ausentes nos estudos.
A pesquisa ressalta que dos 58 estudos selecionados, 15 atenderam satisfatoriamente aos critérios de qualidade metodológica, abordando diferentes modalidades de exercícios físicos e/ou intervenções cognitivo-comportamentais, aplicadas de forma isolada ou combinada. Nenhum desses casos, contudo, abordou intervenções organizacionais.
Apesar dos exercícios físicos, realizados nos locais de trabalho com supervisão de um profissional de saúde (ergonomia participativa), apresentar as melhores respostas na prevenção dos distúrbios musculoesqueléticos, a efetividade dessas ações ainda enfrenta desafios práticos. As autoras também mencionam que, embora os resultados promissores, ainda é complicado realizar pesquisas reprodutíveis com dados confiáveis, especialmente devido às limitações econômicas e à falta de interesse em prevenção por parte da economia de mercado. Esses fatores reforçam a necessidade de ações práticas nos ambientes de trabalho, com foco na proteção da saúde física dos trabalhadores.
Intérpretes de língua de sinais e Dort
O artigo de pesquisa Percepção de sintomas osteomusculares e sua repercussão nas atividades de vida diária em intérpretes de língua de sinais informa que a linguagem é essencial para o desenvolvimento humano, e no caso das pessoas surdas, as línguas de sinais (Libras) são a principal forma de expressão e comunicação. No Brasil, a Língua Brasileira de Sinais é considerada a primeira língua das pessoas surdas e possui estrutura gramatical própria. Ao contrário do que muitos pensam, as línguas de sinais (LS) não são universais, existem variações nacionais como a Língua de Sinais Francesa, Americana, Espanhola e Britânica. Segundo a base Ethnologue, há 144 línguas de sinais catalogadas entre as mais de 7 mil línguas existentes no mundo.
Com foco na realidade dos intérpretes de Libras, a pesquisa qualitativa realizada em Goiânia investigou a percepção de sintomas osteomusculares e os impactos nas atividades diárias desses profissionais. Foram entrevistados 12 intérpretes atuantes nas redes de ensino fundamental, médio e superior, no primeiro semestre de 2021, período marcado pelo trabalho remoto devido à pandemia de Covid-19.
Os dados revelaram três categorias principais: percepção de dor, cansaço e impacto nas atividades cotidianas. Os participantes relataram um aumento significativo da carga física e emocional, causado pela intensificação das atividades on-line e pela ausência de limites entre o ambiente profissional e o doméstico. A conclusão aponta uma sobrecarga excessiva no desempenho da profissão durante o período analisado.
Perda auditiva induzida por ruído
A perda auditiva induzida por ruído (Pair) é uma das doenças ocupacionais mais conhecidas, mas ainda subnotificada no Brasil. Isso compromete o planejamento de ações de saúde pública e oculta a gravidade do problema. Para enfrentar essa realidade, uma oficina educativa foi realizada por meio de programas de Saúde do Trabalhador (ST) na Bahia.
O artigo Enfrentamento da subnotificação da perda auditiva induzida por ruído relacionada ao trabalho: a experiência de uma oficina educativa em planejamento e programação local em saúde do trabalhador, traz ainda que a oficina foi baseada no Planejamento e Programação Local em Saúde (PPLS), abordando desde a compreensão da Pair até a construção de estratégias concretas para ampliar as notificações. A atividade teve cinco etapas e se mostrou eficaz ao promover a mobilização e capacitação dos profissionais.
Como resultado, os participantes elaboraram planos de ação para implementar em seus Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), contribuindo para maior visibilidade do agravo. A experiência demonstra que a educação permanente e o planejamento participativo são ferramentas poderosas para transformar práticas e políticas em saúde do trabalhador.
Texto: Débora Maria Santos